A lei que regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais (Lei n.º 98/2009, de 04 de Setembro) equipara os direitos do trabalhador estrangeiro que exerça atividade em Portugal e da respetiva família aos dos seus congéneres portugueses, não sendo incluída no texto a linguagem relativa a estar autorizado a exercer uma atividade profissional subordinada em território português que delimita a aplicabilidade da igualdade de tratamento no Código do Trabalho. O Código do Trabalho (Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro) estabelece a igualdade de tratamento de trabalhador estrangeiro ou apátrida, ou seja, desde que este esteja autorizado a exercer uma atividade profissional subordinada em território português goza dos mesmos direitos e está sujeito aos mesmos deveres do trabalhador com nacionalidade portuguesa.
A lei de estrangeiros em vigor desde 2007 (Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, com as alterações de 2012 e 2015) veio também clarificar a punição de maus-tratos a imigrantes, sendo que quem causar ofensas graves à integridade física ou a morte do imigrante é punido com pena de prisão de dois a oito anos. Por outro lado, a lei de estrangeiros portuguesa salvaguarda a obtenção de autorização de residência temporária aos nacionais de países terceiros que, tendo sido vítimas de condições de trabalho particularmente abusivas, nomeadamente as suscetíveis de afetar a sua saúde e a segurança, denunciem a infração e colaborem com as autoridades. Desse modo, o medo da expulsão é formalmente removido enquanto fator que constrangeria os imigrantes indocumentados a aceitar condições laborais particularmente abusivas e de maior risco.
Algumas instituições assumem em Portugal um papel central no enquadramento dos trabalhadores (incluindo os imigrantes) e da sua segurança laboral. Desde logo a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) assume competências de inspeção do trabalho para controlar o cumprimento da legislação da segurança e saúde no trabalho e, em caso do seu incumprimento, aplicar sanções, bem como a promoção de políticas de prevenção dos riscos profissionais, quer no âmbito das relações laborais privadas, quer no âmbito da Administração Pública (Decreto Regulamentar n.º 47/2012). A ACT é também o ponto focal nacional da Agência Europeia para a Segurança e a Saúde no Trabalho (EU-OSHA), que, como se lê no Regulamento (CE) N.º 2062/94 do Conselho, de 18 de julho de 1994, está encarregue, a nível europeu, de fornecer às instâncias comunitárias, aos Estados-Membros, aos parceiros sociais e aos intervenientes neste domínio informações técnicas, científicas e económicas úteis no domínio da segurança e da saúde no trabalho (JO L 216 de 20.8.1994, p.1). Para consubstanciar essas funções cabe à ACT a realização de inquérito em caso de acidente de trabalho mortal ou que evidencie uma situação particularmente grave, ao que corresponde, da parte do empregador, a obrigação de lhe comunicar os acidentes mortais, bem como aqueles que evidenciem lesão física grave, nas vinte e quatro horas seguintes à ocorrência (Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro). Este mandato cobre também a situação dos trabalhadores migrantes e constitui fundamento para que a ACT seja chamada a implementar políticas específicas para esses trabalhadores.
O Alto Comissariado para as Migrações (ACM, IP), que tem entre as suas atribuições contribuir para a melhoria das condições de vida e trabalho dos imigrantes, assume também alguma intervenção neste domínio. É importante salientar que o Conselho para as Migrações (órgão de consulta, apoio e participação na definição das linhas gerais de atuação do ACM, I.P.) inclui um(a) representante da Autoridade para as Condições do Trabalho (Decreto-Lei n.º 31/2014, de 27 de fevereiro). Por outro lado, no âmbito dos Centros Nacionais de Apoio à Integração de Migrantes (CNAIM), promovidos pelo ACM, funciona uma delegação da ACT com o apoio da equipa de mediadores interculturais desse serviço integrado para a integração dos imigrantes em Portugal.
Ao Gabinete de Estratégia e Planeamento (GEP) compete garantir o apoio técnico ao planeamento estratégico e operacional e à formulação de políticas internas e internacionais do Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social, assumindo-se como uma fonte de informação estatística acerca dos Acidentes de Trabalho em Portugal. Os dados recolhidos e disseminados pelo GEP não são, porém, comparáveis à informação recolhida pela ACT nos inquéritos de acidentes de trabalho, uma vez que resultam da recolha e tratamento estatístico de participações e mapas enviados mensalmente ao GEP pelas Companhias de Seguros e Empresas com capacidade financeira para a cobertura dos riscos de acidentes de trabalho. Tal torna o GEP numa fonte mais abrangente por não se focar exclusivamente nos óbitos ou acidentes graves mas, por outro lado, menos abrangente na medida em que não regista os acidentes que acontecem a trabalhadores não segurados.
A nível internacional, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) é a instituição de referência na segurança no trabalho. A declaração relativa aos seus fins e objetivos vincula-a à execução de programas próprios à realização de uma proteção adequada da vida e da saúde dos trabalhadores em todas as ocupações (Declaração de Filadélfia). Complementarmente a Organização Mundial de Saúde (OMS), define no seu objetivo estatutário que todos os povos alcancem o nível de saúde mais elevado possível, o que dá cobertura ao tema da segurança no trabalho dos imigrantes. O tema surge mais explicitamente em vários documentos concretos desta organização, como é o caso da Declaração sobre a Saúde dos Trabalhadores que reconhece que a migração internacional dos trabalhadores, a pobreza persistente, o crescimento da economia informal e a discriminação no local de trabalho estão cada vez mais associados com condições de trabalho pouco saudáveis, pouco seguras e injustas. A OMS considera que estas tendências merecem particular atenção, bem como novos e criativos métodos de monitorização e intervenção. Outro documento da OMS que merece referência é A Saúde dos Trabalhadores: Um Plano Global de Ação, que insta os seus Estados Membros a procurarem garantir cobertura – em termos de intervenções essenciais e serviços mínimos de saúde ocupacional destinados à prevenção primária de doenças e lesões ocupacionais ou associadas ao trabalho – para todos os trabalhadores, incluindo migrantes.
Ao nível europeu também têm surgido inúmeras recomendações para uma melhor intervenção em matéria da segurança no trabalho, assumindo-se metas para a diminuição e combate à sinistralidade laboral nos países europeus, nomeadamente dos trabalhadores imigrantes que residem na Europa. A Estratégia comunitária para a saúde e a segurança no trabalho 2007-2012 (COM(2007) 62 final) reconheceu que certas categorias de trabalhadores continuam a estar demasiado expostas aos riscos profissionais, nomeadamente, entre outros, os trabalhadores migrantes. Nesse sentido, recomendava-se que a Agência Europeia para a Segurança e a Saúde no Trabalho (EU-OSHA) promovesse, através do seu observatório dos riscos, relatórios de análise dos desafios específicos em termos de saúde e segurança decorrentes de uma maior integração no mercado de trabalho das mulheres, dos trabalhadores imigrantes e dos trabalhadores mais jovens e mais velhos. Esta análise ajudaria a detetar e monitorizar as tendências e os novos riscos e a identificar medidas essenciais. Ainda neste documento, é referido que uma atenção especial deve ser também dada (…) à formação de trabalhadores que os sensibilize para os riscos na empresa e para a forma de os prevenir e combater. Este aspeto é particularmente relevante (…) para os trabalhadores migrantes.
É de notar, porém, que a Estratégia da UE para a saúde e segurança no trabalho 2014-2020 (COM(2014) 332 final) deixa cair a referência explicita aos trabalhadores imigrantes enquanto categoria demasiado exposta aos riscos profissionais, embora o parecer do Comité Económico e Social Europeu (CESE) sobre esta mesma comunicação (2015/C 230/13) mencione que este comité tem sistematicamente referido a necessidade de assegurar a melhoria das condições de saúde e segurança de categorias específicas de trabalhadores, entre os quais os imigrantes. Já o parecer do Comité das Regiões Europeu acerca do mesmo texto (2015/C 140/04) vai mais longe, considerando - a propósito do objetivo estratégico relativo ao melhor controlo do cumprimento da legislação em matéria de saúde e segurança no trabalho pelos Estados-Membros - “(…) atual e estratégica a decisão de criar uma plataforma europeia para a proteção da saúde dos trabalhadores migrantes, tendo em conta a capacidade de intervenção cada vez menor dos Estados para fazer frente aos efeitos da globalização e das alterações sociodemográficas decorrentes sobretudo dos fenómenos migratórios.” Já este ano, a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Condições de trabalho mais seguras e mais saudáveis para todos - Modernização da política e da legislação da UE em matéria de saúde e segurança no trabalho (COM(2017) 12 final) vem reconhecer ainda que as medidas de gestão dos riscos devem (…) ter em conta os riscos específicos que afetam (…) os migrantes (…). Para tal, há que conceber medidas preventivas e de proteção específicas, em função das necessidades destes grupos de trabalhadores.
Em Portugal alguns planos de ação, que foram sendo desenvolvidos desde a década passada, reconheceram a importância do tema, prevendo algumas medidas de promoção para uma melhor segurança dos trabalhadores imigrantes e redução da sua sinistralidade laboral. Desde logo o primeiro Plano para a Integração dos Imigrantes (Resolução do Conselho de Ministros n.º 63-A/2007, de 3 de maio) estabeleceu uma medida (medida 7), que configurava uma campanha de sensibilização específica sobre segurança no trabalho para trabalhadores imigrantes em sectores de atividade com maior incidência de sinistralidade (MTSS/ACT). No segundo Plano para a Integração dos Imigrantes (Resolução do Conselho de Ministros n.º 74/2010, de 17 de setembro) não havia medidas específicas de combate à sinistralidade laboral dos imigrantes, mas, atendendo à maior vulnerabilidade dos trabalhadores indocumentados previa-se uma medida de reforço da atividade inspetiva sobre entidades empregadoras que utilizem ilegalmente mão -de -obra imigrante (MTSS/ACT; MAI/SEF) (medida 15). Finalmente, no plano que sucedeu a esses dois, Plano Estratégico para as Migrações (2015 -2020) (Resolução do Conselho de Ministros n.º 12-B/2015, de 20 de março), considerou-se a medida 22 que contempla a promoção de informação sobre direitos e deveres dos empregadores estrangeiros, nas áreas das relações laborais e segurança e saúde no trabalho, nomeadamente através da dinamização de ações de sensibilização/informação com associações de empregadores.
Complementarmente aos planos específicos para a integração dos imigrantes, Portugal tem assumido algumas estratégias de planos de promoção da segurança e saúde no trabalho que integram também nas suas preocupações os trabalhadores imigrantes residentes no país. A Estratégia Nacional para a Segurança e Saúde no Trabalho 2008-2012 (Resolução do Conselho de Ministros n.º59/2008, de 1 de abril) – documento orientador das políticas públicas de segurança e saúde no trabalho, promovido pela ACT e parceiros sociais - reconheceu os trabalhadores imigrantes como uma categoria especialmente vulnerável aos riscos profissionais, seguindo as orientações inerentes à Estratégia Comunitária de Segurança e Saúde no Trabalho para 2007 – 2012 que recomendava os Estados Membros a darem particular atenção, entre outros assuntos, aos trabalhadores imigrantes. Nesse âmbito os imigrantes foram identificados como alvos de campanhas de consciencialização e sensibilização pública; objeto de ação articulada entre os serviços com competências na área e entidades públicas com atribuições específicas; e grupo-alvo de informação sobre legislação nacional de segurança e saúde no trabalho, incluindo edição nas respetivas línguas maternas. Mais recentemente, a medida 3 da Estratégia Nacional para a Segurança e Saúde no Trabalho 2015-2020 (Resolução do Conselho de Ministros n.º 77/2015, de 18 de setembro) prevê também o desenvolvimento de ações de prevenção dirigidas a públicos específicos, nomeadamente (…) migrantes.
A partir de 2013 o Programa Nacional de Saúde Ocupacional 2013-2017 (PNSOC 2013-2017) também passa a assumir a temática dos trabalhadores imigrantes e da sua saúde no trabalho, nomeadamente na sua associação aos ditos trabalhos 3’Ds (demanding, dangerous, dirty), ou seja, os trabalhos mais exigentes, perigosos e sujos. O documento refere que, de acordo com a OMS, há uma tendência observável para a transferência do risco para grupos menos favorecidos como, entre outros, os imigrantes. Nesse sentido, as suas prioridades estratégicas estabelecem que o programa se dirige prioritariamente (…) às populações mais vulneráveis no contexto de trabalho, designadamente: (…) os trabalhadores migrantes, entre outros.